Cefaleia em Salvas: Tudo o que Você Precisa Saber

A Cefaleia em Salvas é considerada uma das condições médicas mais dolorosas que um ser humano pode experimentar, frequentemente descrita pelos pacientes como a “dor de cabeça suicida”. Diferente de uma enxaqueca comum, ela é uma condição neurológica primária, caracterizada por crises de dor extremamente intensa, unilateral e em salvas (períodos agrupados). Conhecer seus sinais é o primeiro passo para um diagnóstico correto e um tratamento que pode devolver a qualidade de vida.

O que é a Cefaleia em Salvas?

É uma condição neurológica caracterizada por crises de dor de cabeça excruciante, estritamente unilateral (sempre do mesmo lado), tipicamente localizada ao redor ou atrás de um dos olhos. A dor é descrita como uma sensação de perfuração, queimação ou “olho sendo empurrado para fora”. A intensidade é tão avassaladora que pacientes relatam uma incapacidade total de ficar parados, frequentemente andando de um lado para o outro ou balançando o corpo durante a crise, em contraste com a enxaqueca, onde o repouso em silêncio e no escuro é buscado.

A causa exata ainda não é completamente elucidada, mas acredita-se que o hipotálamo – uma pequena região do cérebro que controla nosso ritmo circadiano – desempenhe um papel central. Anormalidades no funcionamento do hipotálamo explicariam a natureza cíclica e cronológica das crises, que costumam ocorrer no mesmo horário.

Durante uma crise, há uma ativação simultânea do:

  • Sistema Nervoso Parassimpático: Responsável pelos sintomas autonômicos ipsilaterais (do mesmo lado da dor), como lacrimejamento e coriza.
  • Nervo Trigêmeo: Responsável pela sensação de dor na face, causando a dor lancinante.

Essa “tempestade perfeita” neurológica e vascular resulta na crise característica da cefaleia em salvas.

A cefaleia em salvas apresenta um perfil demográfico marcante:

  • Gênero: Atinge predominantemente homens (cerca de 3 a 4 vezes mais que mulheres).
  • Idade: Geralmente inicia-se por volta dos 20-40 anos.
  • Fatores de Risco: O consumo de álcool é um potente gatilho durante o período de salvas, mas não fora dele. O tabagismo também é um fator frequentemente associado.

Apesar de sua gravidade, a cefaleia em salvas é frequentemente confundida com enxaqueca ou problemas sinusais. Esse erro leva a um atraso de anos no diagnóstico, durante os quais o paciente sofre com dores incapacitantes sem o tratamento adequado. Educar a população e os profissionais de saúde sobre seus sinais únicos é fundamental.

A crise de cefaleia em salvas é inconfundível quando se conhecem seus detalhes:

  • Dor: Unilateral, extremamente intensa, em torno do olho/têmpora, com duração curta (15 a 180 minutos), mas de intensidade insuportável.
  • Frequência: As crises ocorrem em “salvas”. Durante um período ativo (que dura semanas ou meses), o paciente pode ter de 1 a 8 crises por dia, muitas vezes como um relógio, à mesma hora todas as noites – frequentemente 1 a 2 horas após adormecer.
  • Sintomas Autonômicos Ipsilaterais (do mesmo lado da dor):
    • Olho vermelho e/ou lacrimejante.
    • Pálpebra caída (ptose) ou inchada.
    • Nariz entupido (congestão nasal) e/ou corrimento nasal (rinorreia).
    • Sudorese facial.
    • Agitação e inquietação (o paciente não consegue ficar deitado quieto).
  • Período de Salvas e Remissão: A doença se manifesta em ciclos. Um período de salvas (crises diárias) é seguido por uma remissão (período sem nenhuma dor), que pode durar meses ou até anos.

O diagnóstico é clínico, realizado por um neurologista, com base no relato detalhado do paciente sobre a dor e os sintomas associados. Não existe um exame específico para confirmá-la. No entanto, o médico pode solicitar exames de imagem, como Ressonância Magnética do Crânio, para afastar outras causas graves de dor de cabeça que podem mimetizar a cefaleia em salvas (diagnóstico diferencial).

Tratamento da Crise Aguda: A velocidade do alívio é crucial. Os tratamentos abortivos mais eficazes são:

1. Oxigênio Inalatório a Alto Fluxo: É a terapia de primeira linha. Administrado com máscara facial, a 100% de concentração e um fluxo de 7-15 litros por minuto, por 15-20 minutos, com o paciente sentado e inclinado para frente. Pode abortar a crise em 5 a 20 minutos e é isento de efeitos colaterais.

2. Triptanos Injetáveis ou Intranasais: O sumatriptano subcutâneo é extremamente eficaz e rápido. Sprays nasais também são uma opção. Triptanos orais são muito lentos e geralmente inúteis, dada a curta duração da crise.

Tratamento Preventivo: O objetivo da prevenção é interromper as crises durante o período de salvas e encurtar sua duração. Deve ser instituído assim que o período de salvas começa.

  • Preventivos de Primeira Linha:
    • Verapamil: É o medicamento preventivo mais utilizado e eficaz.
    • Corticoides: Como a Prednisona, são usados por um curto período para “quebrar” um ciclo de salvas rapidamente.
  • Preventivos de Segunda Linha e Alternativas:
    • Carbonato de Lítio.
    • Topiramato.
    • Ácido Valproico.
  • Terapias Modernas e Inovadoras:
    • Anticorpos Monoclonais (como o Galcanezumabe e Erenumabe): Medicamentos biológicos que bloqueiam a ação do peptídeo relacionado ao gene da calcitonina (CGRP), uma molécula-chave no processo da dor. Representam um avanço significativo no tratamento preventivo.
  • Bloqueio do Nervo Occipital: Uma injeção de anestésico e corticoide na região occipital pode aliviar a dor e interromper um ciclo.
  • Neuromodulação: Estimulação do nervo vago ou do nervo occipital maior são opções para casos refratários.

A cefaleia em salvas não tem cura, mas isso não significa que não possa ser controlada. Com um diagnóstico preciso e um plano de tratamento personalizado sob a orientação de um neurologista, é possível:

  • Abortar as crises rapidamente quando elas ocorrem.
  • Prevenir o surgimento de novas crises durante os períodos de salvas.
  • Reduzir a duração e a intensidade dos ciclos de dor.
  • Devolver a qualidade de vida ao paciente, permitindo que ele viva plenamente, mesmo durante os períodos de salvas.

Se você se identifica com esses sintomas, procure um neurologista. Você não precisa conviver com a pior dor conhecida pela medicina. Um neurologista pode ajudar.

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